Um dos discos mais clássicos dos Doors, o Morrison Hotel, chega aos 50 anos.
Completar meio século e continuar relevante é tarefa à qual apenas as obras-primas sobrevivem. Este artigo reune algumas curiosidades sobre a gravação, informações sobre o momento pela qual a banda passava e uma análise faixa a faixa.

Lançado pela Elektra, o quinto disco dos Doors foi recebido com entusiasmo por boa parte da imprensa especializada da época.
A Rolling Stone foi uma famosa exceção, classificando o disco como abaixo dos dois primeiros. Lester Bangs, provavelmente o mais importante crítico musical de todos os tempos, afirmou em sua resenha que Roadhouse Blues era uma das melhores faixas já gravadas pela banda, mas que daí em diante o disco ia ladeira abaixo.
Completando o time dos descontes e provando que não se pode a agradar a todos, o empresário dos Doors à época, Bill Siddons, afirmaria mais tarde que foi este disco que matou a banda.
Independente das críticas negativas, este disco se incorporou aos preferidos dos fãs dos Doors. Quando de seu lançamento, Jim afirmou à revista Jazz & Pop que era “um álbum sobre a América”.
The Doors estavam num período turbulento às vésperas deste lançamento. Morrison enfrentava uma acusação de assédio após um distúrbio num voo (o vocalista estava a caminho de Phoenix, Arizona, para assistir a uma apresentação dos Rolling Stones). Vários shows da turnê anterior também foram cancelados devido à acusação de perturbação pública (o vocalista gostava de fazer gestos obscenos durante as apresentações).
Nesta época, Jim Morrison havia ganho peso e cultivado uma hirsuta barba (que foi devidamente feita para a sessão de fotos).
Depois de um terceiro e quarto discos mais mornos, Morrison Hotel trouxe os Doors de volta ao primeiro time do rock. Isso, claro, pensando em termos artístico-musicais, já que todos eles se tornaram grandes sucessos comerciais, ganhando discos de ouro. Morrison Hotel vendeu 500 mil unidades em apenas dois dias.
O disco anterior, The Soft Parade, havia fugido um pouco da tradicional atmosfera sonora da banda ao incluir arranjos de cordas e metais. Este disco marca o retorno da banda aos arranjos mais sóbrios.

As seis primeiras músicas que compunham o lado A do LP formam uma suíte chamada Hard Rock Cafe. O lado B é homônimo do álbum, Morrison Hotel.
A fotografia da capa do álbum foi tirada através do vidro, com a banda no lobby do Morrison Hotel. O estabelecimento, real, localizado no número 1246 da South Hope Street, alugava quartos por 2 dólares e 50 centavos, atraindo uma clientela não muito glamourosa.
O funcionário do hotel havia proibido que eles tirassem fotos dentro do estabelecimento, então eles iniciaram uma sessão de fotos externa, em frente ao hotel. Quando perceberam que o funcionário dera uma rápida saída, aproveitaram e correram para a mesa, se posicionando enquanto o fotógrafo ia registrando de diversos ângulos.

FAIXA A FAIXA
Roadhouse Blues – O disco abre com esta verdadeira pedrada, que se tornaria um dos maiores hits da banda. A atmosfera da música é absolutamente sensual: a voz quente e áspera de Morrison, a gaita, os teclados, guitarra e bateria confluindo para este efeito.
As gravações desta faixa levaram dois dias para serem finalizadas. No segundo dia a coisa decolou, com o guitarrista de blues Lonnie Mack fazendo a poderosa linha de baixo e John Sebastian (ex-Lovin’ Spoonful) mandando ver na gaita.
Waiting for the Sun – Mais misteriosa e psicodélica, outra faceta comum à obra dos Doors. Curiosamente esta música havia sido gravada em 1968 para o disco de mesmo nome, mas acabou ficando de fora.
You Make Me Real – Aqui os teclados assumem um timbre que remete aos primórdios do rock, bem como a estrutura harmônica e clichês melódicos. As teclas são quase onipresentes, mesmo durante o alucinante solo de guitarra, ecoando Jerry Lee Lewis em Great Balls of Fire.
Peace Frog – Inicia com um riff de guitarra meio rasgado e uma “linha de baixo” dançante (novamente com um quê anos 50 – lembra bastante A Little Less Conversation, de Elvis).
Blue Sunday – Momento mais calmo e introspectivo, com uma aura onírica. Aqui a guitarra assume a melodia de maneira mais clara, com um fantástico timbre limpo.
Ship of Fools – Inicia com uma linha de baixo (feita no piano) e em seguida cai num riff cativante conduzido principalmente pela guitarra. O solo também é bem bacana, num belo trabalho de Robby Krieger. A letra desta música tem uma pegada ecológica e ironiza a pretensão da chegada do homem à lua no ano anterior.
Land Ho! – Uma das menos inspiradas do disco, mas não chega a comprometer. Os momentos mais interessantes são as intercalações entre os versos cantados por Morrison e as frases de guitarra. Uma parte do riff traz um cromatismo que traz um efeito muito interessante.
The Spy – Andamento lento na bateria e os vocais quase falados de Morrison tornam a faixa um pouco arrastada.
Queen of the Highway – Melodia composta por Robby Krieger. Manzarek utilizou nesta faixa o Fender Rhodes, o mundialmente famoso piano elétrico, criando um efeito jazzy.
Indian Summer – Como o título sugere, evoca um leve toque oriental, com as frases de guitarra saindo das tradicionais pentatônicas. Esta música fora gravada em 1966 para o disco de estreia, no qual acabou não entrando.
Maggie M’Gill – A derradeira faixa do disco traz de volta o blues sobre o qual a obra dos Doors é tão calcada.

FICHA TÉCNICA
Jim Morrison (Vocais)
Robby Krieger (Guitarra)
Ray Manzarek (Piano & Órgão)
John Densmore (Bateria)
Ray Neapolitan (Baixo)
Lonnie Mack (Baixo em Roadhouse Blues e Maggie M’Gill)
G. Puglese* (Gaita em Roadhouse Blues)
Produzido por: Paul A. Rothchild
Engenharia de Som: Bruce Botnick
Design: Gary Burden
Fotografia: Henry Diltz
*Na verdade, “G. Puglese” foi o pseudônimo sob o qual o nome de John Sebastian recebeu créditos no disco. Isso deveu-se a uma suposta vergonha de ser associado à banda, já que Sebastian era um compositor de baladas sentimentais açucaradas.
Fontes:
Jim Morrison: Life, Death, Legend (Stephen Davis)
Jim Morrison – Ninguém Sai Vivo Daqui (Jerry Hopkins/Danny Sugerman)
Ouça Morrison Hotel no Spotify.